Há uma referência que se destaca em sua carta, cita sua aprendizagem com dois médiuns vindos do Brasil;
Portanto, é uma referência contundente, que nos leva a considerar que o Senhor Augusto Messias de Burgos, ao angariar o respeito do Cónego Teixeira, autoridade máxima
da igreja em Cabo Verde, precisou
de tempo e bom conhecimento sobre o “Espiritismo Racional e Cientifico"
codificado pelo mestre Luiz de Mattos, para esclarece-lo sobre a dualidade da vida.
Assim, ao levar a semente de tão bela
Doutrina à Cabo Verde, nota-se que, passados pouco mais de 100 anos, é
fato notório que a semente foi bem plantada, pois o Racionalismo Cristão está presente em 7 das 9
ilhas de Cabo Verde, e continua gerando novas sementes, que são levadas pela espontaneidade do povo Cabo-verdiano à enfrentar o mar e alcançar países distantes.
2ª. Edição - 1927
ESPIRITISMO
PARTE VI DO RELATÓRIO
DIRIGIDO À SANTA SÉ
Da estranha, ignará,
abstracta e arbitrária imputação da heresia (!) seguida da penalidade da
prohibição de dizer missa na igreja e nas capellas, com a dupla coação phisica
e moral, dentro da própria freguezia que considero canonicamente minha enquanto
o contrário não fôr resolvido pelo Summo Pontífice, nada posso dizer
concretamente, enquanto não fôr concretamente accusado, para então me defender
perante quem de direito pertence ouvir e julgar-me.
Mas, constando-me aberta
uma secreta devassa, diligenciada pelo já referido anti parocho Loff, e tendo
eu sabido por um dos depoentes, meu acolytho de missa, que uma das inquirições
é o facto de eu estudar o espiritismo, vou, com muita satisfação, expôr à Vossa
Santidade, com toda a franqueza e lealdade, o que penso a respeito,
sujeitando-me de boa mente, a vontade, à suprema decisão da Santa Sé e do
Soberano Pontífice, a cuja obediência tenho a mais intima satisfação de prestar
a mais completa homenagem.
Beatíssimo Padre!
Passando-se e
demorando-se nessa ilha dois mediuns, vindos do Brasil, tive eu a felicidade de
observar mais caracteristicamente, a extraordinária evidencia e importância
moral dos factos.
Convenci-me de que a
palavra “medium” não significa mais que um meio, um instrumento. Um verdadeiro
medianeiro dos espíritos, revestido de dons que só a Deus pertence conceder,
como e quando lhe apraz, para agente extraordinário da Verdade e Amor, sendo
feliz aquelle que corresponde à graça, e infeliz aquelle que a despreza.
É assim que o Espiritismo
considera mediuns todos os prophetas e thaumaturgos, todo os grandes
missionários do Bem, como por exemplo: Santa Joana d’Arc, vendo, ouvindo,
agindo; Santo António, desdobrando-se e operando; S. Paulo, vendo e ouvindo
Jesus;
Beata Margarida Alacoque, em Peray, ouvindo e recebendo revelações bem
como Melania e Mário em La Salette, e Bernardete em Lourdes, ouvindo e
conversando com a Immaculada; S. Francisco de Assis, Santa Thereza de Jesus
directamente, materialmente operadas destacando-se os factos dados com a
eleição de Santo Ambrosio, pagão, governador civil, proclamado por um medium
criança para substituir o tyranico Auxencio, injusto e mau, agindo a moda de S.
João Baptista contra os grandes criminosos, e desdobrando-se para assistir ás
exéquias de S. Martinho em Tours, estando adormecido em Milão, durante a missa
que celebrava.
Medium ou piedoso
medianeiro do Espírito Santo foi Scupoli no “combate espiritual”, foi kemps na
“Imitação”, foi São Francisco de Sales na “Pholothéa”, foi Santo Affonso de
Ligorio nas suas obras, foi Affonso Rodrigues nos “Exercícios”, foi Arvisenet
no “Memoriale”, foi Santa Thereza, Santa Gertrudes, de la Puente, São João da
Cruz e tantos outros nas suas mysticas obras, quaes Evagelhos immenso amor de
Deus e do próximo, quaes therapeuticas divinas, agindo elles como engenheiros,
como cantoneiros, como guias de contricta estrada que conduz á porta estreita
da larga mansão da vida eterna!
E taes são os bons
médiuns, de moral perfeita, servos fieis que não desprezam a graça, os dons que
recebem santificando-se a si e santificando ao próximo.
Mas aquelles que
desprezam esses dons e se não santificam, servindo de escandalo em vez de
exemplo, abusando da graça, tornando-se perversos, pela soberba, pelo egoísmo,
pela escravidão dos prazeres, pela pratica do mal, esses são os mediuns dos
maus espíritos que attrahem por suas culpas, por sua impenitência, servos
inúteis, servos, rejeitados, mas sempre perdoados, quando arrependidos, porque
é infinita a mesericórdia divina.
D’ahi, segundo os
instrumentos bons ou maus, os dois campos diversos, oppostos, distinctos do Espiritismo.
Dum lado, o bom,
racional, piedoso e benéfico, organizado pelos bons espíritos, em missão do
bem, e só do bem, servido por mediuns da moral perfeita e coração piedoso,
constituindo na terra e no Espaço o verdadeiro Reino de Jesus; d’outro lado, o
mau, supersticioso, irreverente, orgulhoso e maléfico, organizados pelos
espíritos maus, em prática do mal e só do mal servido por médiuns perversos,
immoraes desde o curandeiro, o sortilego, o feiticeiro até os soberbos
phariseus e os vendilhões do templo, constituindo na Terra e no Espaço o
tenebroso reino chamado de Satanaz, que sabe “quod modicum tempus palet!...”.
APOCALYPSE XII 12
Este, defraldando a negra
bandeira do vício, da guerra e do ódio em todos os tempos, em todos os logares,
sob diversas formas e títulos, e praticando consciente ou inconscientemente
todos os males, recrudesceu da ira, ao saber que se puzeram em campo, em
reniado prelio, os bons espíritos sob vontade divina, para resultar sem demora,
effectiva até a eternidade em todos os séculos e mundos felizes, superiores à
Terra, obra da nossa redempção consumado no sacrificio da Golgotha pelo Divino
Mestre, sempre presente onde houver dois ou três piedosamente reunidos em seu
nome, continuamente na Terra, na sublime concentração do Augusto Mystério da
Eucharistia e que sempre activo, generoso e zeloso na sua vinha, não pode
permitir o exclusivo império dos maus contra os bons que protege, abroquella e
guia, como seguro caminho, verdade e Vida Foco de Luz e Amor que desterrará para
mundos inferiores os espíritos rebeldes perturbadores da paz, da ordem e do bem
social e eterno, como já na prece final das missas diariamente suplicamos à
Omnipotência divina.
E não há poder tenuemente capaz de abstrair a que Jesus desça aos corações piedosos e puros humildemente suplices, porque a sua divina palavra jamais deixara de ser cumprida, porquanto Elle disse: – Pedi e recebereis!
E tal reunião é a piedosa
sessão espirita, em cujas correntes e torrentes de graça se curam os doentes.
Sou, pois,
espiritualista, porque não sou materialista, e porque o que antes por
princípios eu cria, eu o creio agora por experiência própria, pela razão
esclarecida, pelo Dom de Deus que a todos seja concedido conhecer.
E sou espirita, porque
creio na realidade dos factos ou manifestações espiritas, reaes, palpáveis,
tangíveis, iniludiveis, ao alcance de todas as observações, experimentalmente
verificadas, scientificamente exactas, não entrando, porem, em controvérsias
subtis e infecundas, nem pretendendo prescrutar os mystérios divinos ou
princípios eternos, ainda escondidos, a nossa condição actual, mas recebendo só
aquillo que me dá, e agradecendo e comunicando tudo o que recebo.
E também sou médium, medianeiro
da misericórdia Divina, escrevendo o que me é ordenado, dizendo o que é
preciso, agindo como fôr necessário, embora a minha cabeça, à imitação da do
Baptista, tenha que merecer as honras de uma salva de prata nas mãos das
Herodiades dos tempos hodiernos.
Não tenho culpa de ser
medianeiro na cura dos doentes, na expulsão dos espíritos obsessores, pela
simples imposição das mãos e pela prece a Deus, Pae Omnipotente, pelos
merecimentos do Nosso Senhor Jesus Cristo, nenhuma culpa tenho, quando com surpresa,
espontaneamente, vejo maravilhas de luz, suavíssimas, bellas com extraordinária
commoção de amor, alegria e paz que só Deus provêm.
Ora, o bom fruto só da
boa arvore é que pode provir, segundo as palavras do Redemptor.
E se Satanaz, imputado
agente de todos os factos espiritas, nos proporciona paz arredando-nos do mau
caminho, fazendo nos bons christãos, moraes piedosos, humildes, caritativos,
puros, é porque então elle próprio está convertido, e tomou a missão reparadora
de exterminar o mal, porquanto se satanaz expulsa Satanaz, o seu reino cae,
como aos Phariseus respondeu o Christo jesus.
É que é chegado,
Santíssimo Padre, o tempo da poda; e a gemebunda Rola dos Centraes não consente
mais o desperdício do seu amor despadaçado na Rua de Amargura, crucificado no
Golgotha, escarnecido na Terra.
Parece-me, pois, que os
factos espiritas devem merecer attenção analytica de todos, dando-se-lhes uma
segura orientação, de forma a aproveitar-se a boa vontade dos que já crêem no
Allem, e dos que já não podem esconder a lâmpada por baixo do Alqueiro.
Firme, porem, no meu
posto, espero de Deus toda a sua misericórdia, todo o seu auxílio, para
prosseguir intemerato sempre, no bom caminho, com toda a caridade com boa
consciência, com fé não fingida, como ensina S. Paulo, para que vencedor receba
o desconhecido maná de Apocalypse.
S. Vicente de Cabo Verde,
2 de Setembro de 1912
António Manoel Da Costa
Teixeira, Cónego capitular da Sé de Cabo Verde.
Nosso "Cabo Verde é Vida" agradece a colaboração na edição deste documento dos Cabo-verdianos, Senhores Antão José Lopes da Luz e ao Senhor Martinho de Mello Andrade.
Conheça: Burgospedia - Comunidade Burgalesa
Nosso "Cabo Verde é Vida" agradece a colaboração na edição deste documento dos Cabo-verdianos, Senhores Antão José Lopes da Luz e ao Senhor Martinho de Mello Andrade.
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