A encarnação do espiritismo em São Vicente entre 1911 e 1931, principiara a circular em São Vicente (e, esparsamente, noutras ilhas de Cabo Verde) a doutrina que então se chamava espiritismo racional e científico cristão. Esta variante do espiritismo de Allan Kardec começara a desenvolver-se em 1910 no Centro.
Amor e Caridade da cidade de Santos, um dos principais portos do Brasil, desde que o negociante português Luiz de Matos assumira a presidência daquela casa. Irradiara dali para a ilha de São Vicente, a bordo de um vapor, cerca de um ano depois.
A história do racionalismo cristão no Brasil será objecto do próximo capítulo. Por agora deter-me-ei na história do espiritismo racional e científico cristão em Cabo Verde no período compreendido entre 1911 e 1931. Mais tarde regressarei a Cabo Verde, para relatar a inserção do espiritismo na sociedade mindelense desde 1932 até aos dias de hoje. A opção de tomar o ano de 1932 como marco divisório decorre do seguinte.
Em Janeiro daquele ano, o governador Amadeu Gomes de Figueiredo determinou o encerramento do Centro Espírita Caridade e Amor de São Vicente, cujos estatutos haviam sido aprovados quatro anos e meio antes pelo seu antecessor António Guedes Vaz. O centro já funcionava havia uns vinte anos, desde 1912 ou 1913. O seu encerramento antecedeu em alguns meses a instituição do Estado Novo em Portugal e suas colónias, e inaugurou um longo período de prática clandestina do espiritismo em São Vicente, que terminaria somente com a queda da ditadura portuguesa e a independência de Cabo Verde, alcançada em 1975.
Mais de quarenta anos de clandestinidade não impediram todavia o enraizamento do espiritismo em São Vicente, nem a sua disseminação noutras ilhas do arquipélago e nalguns destinos da emigração cabo-verdiana, como o Senegal, Angola e a Holanda.
O presente capítulo trata, portanto, da história do espiritismo em São Vicente até ao encerramento do Centro Caridade e Amor. Como é que o espiritismo racional e científico cristão, gerado na colónia portuguesa das cidades brasileiras de Santos e do Rio de Janeiro, chegou tão rapidamente a Cabo Verde? Que circunstâncias propiciaram a sua implantação inicial em São Vicente e, depois, noutras ilhas? Eis algumas das questões a que procurarei responder.
São Vicente, finais de Agosto de 1911. Um vapor que zarpara da cidade brasileira de Santos no princípio do mês bordeou ronceiro o Ilhéu dos Pássaros e veio atracar no Porto Grande, a baía sobre a qual se debruça a cidade do Mindelo. No porão, no meio de outra carga, trazia 584 mil litros de milho e vinte mil litros de feijão, tudo embalado em sacas de cem litros, mais mil e duzentos quilos de açúcar, em sacas de sessenta quilos. A mercadoria foi registada na alfândega de São Vicente com o valor de 23.142$000.
Não pagou direitos aduaneiros, ao abrigo de uma disposição que isentava as importações destinadas a obras de assistência e beneficência. Era justamente esse o destino dos mantimentos que acabavam de chegar do Brasil e que uma chusma de estivadores começava a descarregar, sob o olhar atento de Augusto Messias de Burgo.
O milho, o feijão e o açúcar tinham sido enviados pelo Centro Amor e Caridade, o centro espírita de Santos do qual Messias de Burgo era representante em São Vicente naquele tempo, para serem distribuídos gratuitamente aos famintos do arquipélago de Cabo Verde. As autoridades da província mostraram-se reconhecidas./>
A 3 de Agosto, mal foi informado do embarque dos mantimentos no Brasil, o governador Júdice Biker fez publicar uma portaria na qual, em nome do povo de Cabo Verde, agradecia ao Centro Amor e Caridade e a Augusto Messias de Burgo o acto generoso e humanitário.
A 23 de Novembro, terminada a distribuição dos alimentos pelas ilhas, a Comissão Municipal de São Vicente subscreveu
De acordo com as estatísticas das importações em 1911 publicadas no apenso n.º 15 ao Boletim Oficial de 1912.
Portaria n.º 268 de 1911, publicada no Boletim Oficial de 5 de Agosto (n.º 31), p. 271.
Por unanimidade um voto de louvor a Messias de Burgo e ao centro de Santos, pelos relevantes serviços prestados aos famintos.
O semanário A Voz de Cabo Verde, órgão informativo da ala esquerda dos republicanos ilhéus, destoou dos discursos das autoridades, noticiando o caso com ironia:
Em auxílio do povo necessitado [...] veio a benemérita associação “Centro Amor e Caridade” de Santos, que mandou distribuir milho e feijão por todas as ilhas. O seu representante na província, adepto das ideias de Allan Kardec e fervoroso crente dos fenómenos psíquicos, invocando espíritos para melhor fazer a distribuição, nem sempre acertou – talvez por falta de médiuns inteligentes – pois parte da esmola ia parar às mãos de remediados. Eram talvez espíritos maus que, às vezes, vinham intrometer-se nesta cruzada de caridade!
Indiferente ao remoque, Messias de Burgo fez publicar no mesmo jornal um agradecimento ao governador de Cabo Verde e às autoridades das ilhas pelas atenções que se tinham dignado dispensar-lhe.
A encarnação do espiritismo em São Vicente entre 1911 e 1931
Fonte:
Livro - História do Racionalismo Cristão em S. Vicente
Prof. João Vasconcelos
Universidade de Lisboa
O Livro a "História do Racionalismo Cristão em Cabo Verde", está a venda em todas as Casas Racionalistas de Cabo Verde e no Centro Cultural do Mindelo.
Seu custo no escudo Cabo-verdiano é de 800$00 (oitocentos escudos), para os interessados do exterior é de aproximadamente 8 (oito euros), mais os custos de envio.
Poderá ser solicitado à Filial de Ribeirinha, através do Presidente Sr. Arlindo Flávio, no endereço:
arlindo_flavio@hotmail.com
Casas Racionalistas Cristãs espalhadas pelo mundo
Biblioteca digital do Racionalismo Cristão
Agua Fluídica - Como prepará-la em casa
A Limpeza Psíquica
Mr. Martin Luther King Jr.
Amor e Caridade da cidade de Santos, um dos principais portos do Brasil, desde que o negociante português Luiz de Matos assumira a presidência daquela casa. Irradiara dali para a ilha de São Vicente, a bordo de um vapor, cerca de um ano depois.
A história do racionalismo cristão no Brasil será objecto do próximo capítulo. Por agora deter-me-ei na história do espiritismo racional e científico cristão em Cabo Verde no período compreendido entre 1911 e 1931. Mais tarde regressarei a Cabo Verde, para relatar a inserção do espiritismo na sociedade mindelense desde 1932 até aos dias de hoje. A opção de tomar o ano de 1932 como marco divisório decorre do seguinte.
Em Janeiro daquele ano, o governador Amadeu Gomes de Figueiredo determinou o encerramento do Centro Espírita Caridade e Amor de São Vicente, cujos estatutos haviam sido aprovados quatro anos e meio antes pelo seu antecessor António Guedes Vaz. O centro já funcionava havia uns vinte anos, desde 1912 ou 1913. O seu encerramento antecedeu em alguns meses a instituição do Estado Novo em Portugal e suas colónias, e inaugurou um longo período de prática clandestina do espiritismo em São Vicente, que terminaria somente com a queda da ditadura portuguesa e a independência de Cabo Verde, alcançada em 1975.
Mais de quarenta anos de clandestinidade não impediram todavia o enraizamento do espiritismo em São Vicente, nem a sua disseminação noutras ilhas do arquipélago e nalguns destinos da emigração cabo-verdiana, como o Senegal, Angola e a Holanda.
O presente capítulo trata, portanto, da história do espiritismo em São Vicente até ao encerramento do Centro Caridade e Amor. Como é que o espiritismo racional e científico cristão, gerado na colónia portuguesa das cidades brasileiras de Santos e do Rio de Janeiro, chegou tão rapidamente a Cabo Verde? Que circunstâncias propiciaram a sua implantação inicial em São Vicente e, depois, noutras ilhas? Eis algumas das questões a que procurarei responder.
São Vicente, finais de Agosto de 1911. Um vapor que zarpara da cidade brasileira de Santos no princípio do mês bordeou ronceiro o Ilhéu dos Pássaros e veio atracar no Porto Grande, a baía sobre a qual se debruça a cidade do Mindelo. No porão, no meio de outra carga, trazia 584 mil litros de milho e vinte mil litros de feijão, tudo embalado em sacas de cem litros, mais mil e duzentos quilos de açúcar, em sacas de sessenta quilos. A mercadoria foi registada na alfândega de São Vicente com o valor de 23.142$000.
Não pagou direitos aduaneiros, ao abrigo de uma disposição que isentava as importações destinadas a obras de assistência e beneficência. Era justamente esse o destino dos mantimentos que acabavam de chegar do Brasil e que uma chusma de estivadores começava a descarregar, sob o olhar atento de Augusto Messias de Burgo.
O milho, o feijão e o açúcar tinham sido enviados pelo Centro Amor e Caridade, o centro espírita de Santos do qual Messias de Burgo era representante em São Vicente naquele tempo, para serem distribuídos gratuitamente aos famintos do arquipélago de Cabo Verde. As autoridades da província mostraram-se reconhecidas./>
A 3 de Agosto, mal foi informado do embarque dos mantimentos no Brasil, o governador Júdice Biker fez publicar uma portaria na qual, em nome do povo de Cabo Verde, agradecia ao Centro Amor e Caridade e a Augusto Messias de Burgo o acto generoso e humanitário.
A 23 de Novembro, terminada a distribuição dos alimentos pelas ilhas, a Comissão Municipal de São Vicente subscreveu
De acordo com as estatísticas das importações em 1911 publicadas no apenso n.º 15 ao Boletim Oficial de 1912.
Portaria n.º 268 de 1911, publicada no Boletim Oficial de 5 de Agosto (n.º 31), p. 271.
Por unanimidade um voto de louvor a Messias de Burgo e ao centro de Santos, pelos relevantes serviços prestados aos famintos.
O semanário A Voz de Cabo Verde, órgão informativo da ala esquerda dos republicanos ilhéus, destoou dos discursos das autoridades, noticiando o caso com ironia:
Em auxílio do povo necessitado [...] veio a benemérita associação “Centro Amor e Caridade” de Santos, que mandou distribuir milho e feijão por todas as ilhas. O seu representante na província, adepto das ideias de Allan Kardec e fervoroso crente dos fenómenos psíquicos, invocando espíritos para melhor fazer a distribuição, nem sempre acertou – talvez por falta de médiuns inteligentes – pois parte da esmola ia parar às mãos de remediados. Eram talvez espíritos maus que, às vezes, vinham intrometer-se nesta cruzada de caridade!
Indiferente ao remoque, Messias de Burgo fez publicar no mesmo jornal um agradecimento ao governador de Cabo Verde e às autoridades das ilhas pelas atenções que se tinham dignado dispensar-lhe.
A encarnação do espiritismo em São Vicente entre 1911 e 1931
Fonte:
Livro - História do Racionalismo Cristão em S. Vicente
Prof. João Vasconcelos
Universidade de Lisboa
O Livro a "História do Racionalismo Cristão em Cabo Verde", está a venda em todas as Casas Racionalistas de Cabo Verde e no Centro Cultural do Mindelo.
Seu custo no escudo Cabo-verdiano é de 800$00 (oitocentos escudos), para os interessados do exterior é de aproximadamente 8 (oito euros), mais os custos de envio.
Poderá ser solicitado à Filial de Ribeirinha, através do Presidente Sr. Arlindo Flávio, no endereço:
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